RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Reduto progressista no Rio de Janeiro, Niterói vive pela primeira vez um embate entre candidatos de esquerda e direita no segundo turno. Num estado que deu mais votos ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado federal Carlos Jordy (PL) tenta suavizar sua imagem para se adaptar aos eleitores da única cidade que deu vitória ao presidente Lula (PT) na região metropolitana.
O deputado do PL enfrenta o ex-prefeito Rodrigo Neves (PDT), que busca retornar ao comando do município para um terceiro mandato. No primeiro turno, o pedetista teve 48,47% dos votos válidos e o adversário, 35,59%.
Neves conta com apoio de antigos adversários que se uniram para tentar evitar a eleição do aliado de Bolsonaro. Na última segunda-feira (14), ele participou de uma caminhada em Icaraí ao lado do ex-deputado Felipe Peixoto (PSD) e Juliana Benício (ex-Novo e atualmente no Cidadania). Os dois disputaram em 2020 a prefeitura contra o atual prefeito, Axel Grael (PDT), aliado do ex-prefeito.
Neste segundo turno, Neves tem reforçado a estratégia de se apresentar como líder de uma frente ampla na cidade.
“A nossa candidatura, desde o início, representa uma frente ampla, democrática, que tem compromisso com Niterói. Nós enfrentamos, no primeiro turno, a candidatura da extrema direita e do PSOL. Eu não tenho dúvida que, nesse segundo turno, os niteroenses vão ter a oportunidade de comparar as realizações de cada candidato pela cidade”, disse Neves.
Jordy tem evitado a nacionalização da campanha e rejeitado o termo “bolsonarista”, que considera pejorativo. O ex-presidente esteve na cidade apenas em julho, no lançamento da pré-candidatura, e não tem sido explorado nos programas de TV e nas redes sociais do candidato.
“Eu não tenho debatido ideologia, questões nacionais. Quando uma mulher vai num posto de saúde e não tem um atendimento, não tem médico nem medicamento, ela não está preocupada se o prefeito é Bolsonaro ou é Lula”, afirmou Jordy.
Apesar de não nacionalizar a campanha, o candidato do PL gravou vídeo ao lado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apontado como possível presidenciável da direita, caso Bolsonaro permaneça inelegível até 2026.
“Para mim, Tarcísio é o melhor gestor público do Brasil. E a cidade pede isso, alguém que tenha capacidade de gestão”, disse ele.
Questionado se a gestão Bolsonaro não poderia ser também um exemplo, Jordy disse que o governo federal não tem semelhança com o municipal. “A gestão municipal se assemelha muito à própria gestão estadual. Tarcísio dialoga muito com prefeituras. A gestão federal lida com questões que não têm tanta relação com o município.”
Neves, por sua vez, tenta articular uma agenda com Lula na reta final da campanha. Ele critica o adversário por se afastar do ex-presidente.
“Ele escondeu o Bolsonaro da campanha, quando na verdade ele se viabilizou em 2018 como candidato a deputado federal exatamente na onda bolsonarista. Isso só revela o caráter, ou a falta de caráter dele”, afirmou o pedetista.
Jordy afirma que a distância de Bolsonaro de Niterói se deve ao enfoque local da campanha.
“Sou aliado do presidente Bolsonaro e muito grato a tudo que ele fez por mim e pelo Brasil. Só que eu não tenho debatido sobre questões ideológicas. Tenho mostrado que nós temos uma melhor capacidade de gestão para o nosso município. E por isso que nós nem especulamos essa possibilidade de trazer o presidente Bolsonaro para cá”, disse Jordy.
As estratégias se amoldam ao perfil do eleitorado de Niterói. A cidade foi a única em que o Lula venceu no segundo turno em 2022 contra Bolsonaro na região metropolitana do Rio de Janeiro. Desde a redemocratização, só teve prefeitos de siglas de esquerda –incluindo segundos turnos de integrantes de partidos do espectro político.
A disputa tem sido marcada pela troca de ataques. Neves produziu panfletos criticando Jordy, entre outros temas, pela busca e apreensão feita pela Polícia Federal contra o deputado do PL na investigação sobre os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
“Niterói é a cidade com os melhores indicadores de segurança pública. É a única cidade que não tem milícias dominando bairros e territórios. E nós não vamos deixar os amigos de milicianos chegarem próximo da prefeitura”, disse Neves.
Ao se deparar com militantes do pedetista distribuindo o panfleto no Campo de São Bento no último dia 12, Jordy abordou um deles, recolheu o material e os entregou à polícia. Nesta sexta-feira (18), a Justiça Eleitoral autorizou a confecção dos impressos.
“As pessoas sabem, inclusive os meus adversários, que aquilo foi uma grande injustiça. Foi um grande festival de trapalhadas por parte da Polícia Federal. Tanto que não deu em nada”, disse o deputado do PL.
Apesar do embate, Jordy tem tentado transparecer um perfil menos belicoso, que marca sua passagem na Câmara dos Deputados. Nesta quinta-feira (17), visitou uma eleitora que produz bolos em casa, no morro do Preventório, e discursou na favela abordando temas locais.
Contudo, o carro de som tocava às alturas o jingle, composto pelo próprio Jordy, que chamava Neves de ladrão: “Niterói precisa urgente de uma transformação / Mas não tem como acontecer se votar no ladrão”.
A expectativa é que o candidato eleve o tom nesta reta final, destacando processos envolvendo Neves e a sua prisão em 2018 por uma acusação já arquivada. O candidato do PL, em seus discursos, tem enfatizado supostos casos de corrupção na prefeitura.