SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O candidato à Prefeitura de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) representa um movimento novo de influenciadores que vão diretamente para a política sem passar pelo processo tradicional de formação partidária.
O fenômeno mobiliza questões como a busca por soluções para os problemas sociais por meio da tecnologia, sem o intermédio de instituições tradicionais, misturando religião e performance digital na atuação política, segundo especialistas ouvidos pela reportagem.
Segundo Thais Pavez, cientista política e pesquisadora da USP, o influenciador é percebido como uma “espécie de coach da prosperidade” em um contexto no qual “a própria tecnologia é vista como uma utopia, uma forma de alcançar aquilo que o sistema impede as pessoas de ter em um mundo em crise”.
Atrelada à ideia de tecnologia como utopia está a percepção de que as redes sociais favorecem a desintermediação, ou seja, a retirada de cena de instituições tradicionais, que têm se mostrado ineficientes para solucionar problemas sociais.
No lugar dos bancos, por exemplo, fala-se de criptomoedas. Da mesma forma, não é necessário ter uma trajetória em um partido para se tornar político, diz Pavez.
“É a ideia de que instituições, ao não terem conseguido resolver o problema, fazem parte de um sistema que quer se autoperpetuar”, afirma a especialista. Daí a importância de se contra o sistema, como Marçal diz ser.
A ideia de desintermediação aparece também na relação de Marçal com a religião. Segundo Taylor de Aguiar, doutor em antropologia social e pesquisador do Núcleo de Estudos da Religião da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), o influenciador adota um “cristianismo não religioso” que se realiza sem a intermediação da igreja.
Com falas como “a igreja não tem quatro paredes, tem duas pernas” e “cristianismo não é religião, é lifestyle”, o candidato do PRTB radicaliza a centralidade no “eu” em uma lógica empreendedora na qual o indivíduo pode se fazer sozinho no cristianismo, assim como o faz nos negócios. É a ideia do self-made man também ligada à fé.
A perspectiva vai ao encontro da “teologia do coaching”, criticada por membros tradicionais da igreja pelo foco excessivo no aspecto antropocêntrico e material. Segundo Aguiar, trata-se de uma “nova roupagem” da teologia da prosperidade que pecaria, na opinião dos críticos, por aderir a uma psicologia secular e “não bíblica”.
Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, critica tal comportamento nas discussões públicas que tem com o influenciador.
Em vídeo divulgado na primeira quinzena de setembro, disse que Marçal “está fora da igreja há muito tempo” e que a briga com o influenciador teve início quando este “começou a menosprezar pastor” e dizer às pessoas que “você não precisa de pastor, você não precisa da igreja, você pode tomar ceia em casa, qualquer crente pode batizar outras pessoas”.
No caso de Marçal, diz Aguiar, o discurso com tom cristão é importante para sua atuação política desde que se candidatou à Presidência da República em 2022 a candidatura acabou sendo indeferida pela Justiça Eleitoral. Ainda assim, o influencer faz uso da gramática religiosa sem dizer representar uma igreja ou grupo religioso específicos.
Segundo Jorge Chaloub, professor de ciência política da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Marçal é uma figura nativa da internet que adota a imagem de homem de mercado e flerta com o liberalismo econômico radicalizado.
Ao mesmo tempo, age como se estivesse o tempo todo desempenhando uma performance para as plataformas digitais. “É um personagem cuja trajetória na política é inseparável da performance nas redes sociais”, diz. “É como se para ele não houvesse separação entre on e offline”.