GRAMADO, RS (FOLHAPRESS) – Em uma manhã de novembro, turistas subiam e desciam a rua Torta, um dos pontos mais conhecidos de Gramado, na Serra Gaúcha (a 105 km de Porto Alegre).
Enquanto buscavam o melhor ângulo para tirar fotos na ladeira curvilínea, já decorada para o Natal, eles conversavam em grupos, dando forma a uma mistura de sotaques de diferentes estados do país.
O movimento não chegava a lotar a rua, mas quem vive do turismo em Gramado afirma que, aos poucos, visitantes de fora da região Sul estão retornando ao município. O motivo apontado para isso é a reabertura parcial do aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre.
A volta dos voos nacionais ocorreu em 21 de outubro, após cinco meses de paralisação devido aos estragos da enchente que destruiu parte da infraestrutura do terminal, incluindo a pista.
Ao contrário da capital gaúcha, Gramado não sofreu diretamente com as inundações históricas do início de maio, mas amargou um choque nos negócios com o fechamento do principal aeroporto do estado.
Sem o Salgado Filho, ficou mais difícil ou até inviável para o público de fora da região Sul ir até o município conhecido pela vocação turística seja pela redução na oferta de voos próximos, pela carestia das passagens aéreas ou pelo tempo maior de deslocamento.
Herisson Pimenta, 32, viveu essa situação. Morador de São Luís, no Maranhão, o engenheiro havia se programado para conhecer Gramado em junho, mas, com o fechamento do Salgado Filho, a viagem foi postergada para o início deste mês.
Para visitar a cidade gaúcha, a família de Herisson saiu de São Luís em uma conexão até Belo Horizonte. Na capital mineira, pegou outro voo até Campinas (SP), de onde embarcou para Porto Alegre.
O trajeto rodoviário de cerca de duas horas até Gramado foi percorrido com um carro alugado opção frequentemente usada por turistas que desembarcam na capital gaúcha.
“A gente remarcou a viagem e veio agora em novembro, quando conseguiu conciliar com as férias”, disse o engenheiro. Minutos antes de conversar com a Folha, ele brincava e tirava fotos com o filho e a esposa na rua Torta.
‘DE VOLTA AO JOGO’, DIZ REPRESENTANTE LOCAL
Representantes do setor de turismo em Gramado afirmam que há um início de recuperação em curso. A retomada é considerada gradual, até porque o Salgado Filho ainda tem obras para recuperar sua capacidade plena nos próximos meses.
“A reabertura do aeroporto foi como nos colocar de volta ao jogo”, define Rosa Helena Volk, presidente da Gramadotur, autarquia de turismo e cultura do município.
Para se recuperar da crise, a cidade com população estimada em 41,6 mil habitantes aposta na tradicional programação do Natal Luz, que ocorre de 24 de outubro a 19 de janeiro.
O evento promove espetáculos natalinos, além de espalhar luzes e outras decorações pelas ruas e avenidas.
A estimativa é receber em torno de 2 milhões de visitantes durante a celebração, patamar inferior aos cerca de 2,5 milhões da edição passada, segundo Rosa Helena. “É um resultado excelente diante de tudo que houve”, diz.
De maio a julho, auge da crise, a economia de Gramado e região deixou de faturar R$ 500 milhões com a paralisação do aeroporto, estima Claudio Souza, presidente do SindTur Serra Gaúcha, que representa negócios como hotéis, bares, restaurantes e parques temáticos.
Ele diz que, apesar do “recomeço um pouco tardio”, a situação está melhorando. “O consumidor de fora da região Sul está vindo. A gente já sente esse efeito”, afirma.
Conforme Souza, a perspectiva dos hotéis é fechar o mês de novembro com uma ocupação média de 65% a 70%, subindo para a faixa de 70% a 75% em dezembro. No feriado de 15 de novembro, esse percentual chegou a 83%, aponta o dirigente empresarial.
“Até o aeroporto reabrir sentíamos as pessoas receosas em comprar passagens. Agora já há um movimento de mais confiança e segurança”, diz Jéssica Piffer, secretária-executiva da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) na região das Hortênsias, que inclui Gramado.
Considerando voos nacionais com destino a Porto Alegre de 21 de outubro a 31 de dezembro, o preço médio das passagens aéreas, em classe econômica, estava em R$ 1.610 (incluindo a volta), segundo dados levantados pela plataforma Kayak em outubro.
A concessionária Fraport, responsável pelo Salgado Filho, disse à Folha que o terminal recebeu 363 mil passageiros de 21 de outubro a 14 de novembro e 120 mil de 15 a 21 de novembro. A empresa não detalhou os números de iguais períodos de 2023.
No início deste mês, o perfil oficial do aeroporto no Instagram estimou em 428 mil o número de viajantes que deveriam passar pelo local ao longo de novembro.
Trata-se de um contingente em torno de 33% menor do que o contabilizado pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) em voos domésticos em novembro do ano passado (638,7 mil).
O comerciante Anderson Garuzzi, 33, está entre os turistas de fora da região Sul que aproveitaram o retorno do Salgado Filho para conhecer Gramado.
Ele saiu de Vitória, no Espírito Santo, para visitar a cidade gaúcha no início de novembro com a esposa e o filho. A família fez conexão em São Paulo e, após chegar a Porto Alegre, alugou um carro até Gramado.
“A cidade está muito bacana, bem legal”, disse. “O preço é um pouco salgado, mas é normal”, acrescentou.
Para tentar estimular o turismo no Rio Grande do Sul, o governo estadual lançou uma campanha após as enchentes históricas.
“O turismo é muito relevante para a economia gaúcha, movimentando uma expressiva cadeia de emprego e renda e impactando empreendedores e trabalhadores que precisam recuperar o fôlego e voltar a sonhar”, escreveu o governador Eduardo Leite (PSDB) em artigo publicado na Folha em outubro, quando o Salgado Filho foi reaberto.
“Quem vier encontrará um local diverso em gastronomia, cultura e belezas naturais. Gramado é o nosso cartão postal mais famoso, mas há muito mais”, acrescentou o tucano na ocasião.
Maria Geisa Pereira da Silva, 26, está entre os trabalhadores que tiram o sustento do turismo no município gaúcho. Natural de Recife, ela é atendente de uma loja que vende lembranças de Gramado, como canecas, chaveiros e ímãs.
Na definição de Maria Geisa, a cidade estava um “breu” sem os visitantes que usam o Salgado Filho.
“Todo mundo estava na expectativa. É certo que agora está melhorando. Antes, era gente daqui do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina que estava vindo. Agora, tem de outros lugares também.”