Governo Lula começa reforma, e servidor terá de trabalhar mais tempo para chegar ao topo

Foto: ABr

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pôs em marcha sua reforma administrativa ao colocar nas mesas de negociação com os servidores em 2024 o alongamento das carreiras e a redução de salários de entrada para futuros funcionários.

Dos 30 acordos já fechados pelo MGI (Ministério de Gestão e Inovação em Serviços Públicos), 12 deles preveem o aumento no número de degraus que os servidores precisam percorrer para chegar ao topo da carreira, onde estão os maiores salários. Em alguns casos, o percurso antes feito em 13 anos passará a durar 20.

O resultado das negociações é uma primeira consequência prática da diretriz que o MGI quer implementar de forma ampla para toda a administração federal. O órgão fez uma portaria com diretrizes e critérios a serem observados na elaboração de propostas de criação, racionalização e reestruturação de planos, carreiras e cargos.

Uma das diretrizes é o “período mínimo de, preferencialmente, 20 anos para o alcance do padrão final da carreira”. Além disso, o tempo de serviço não será o único critério para a progressão, que deverá observar também o desempenho individual e coletivo do servidor, perfil, qualificação e comprometimento.

“Desde o ano passado, estamos discutindo a parte da nossa reforma administrativa. Na área de pessoas, um dos temas é justamente uma análise sobre as carreiras, que fomos trabalhando paralelamente. Optamos este ano, em vez de uma negociação geral, fazer negociações por carreiras. E começamos a implementar coisas que estão na portaria”, diz a ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck.

“Nos acordos que estamos assinando, elevamos [os degraus das carreiras] para 20 níveis, com progressões anuais. Antes, eram 13 níveis com progressões de 18 meses, mas que tinham regras que permitiam acelerar. Na prática, muita gente chegava ao topo com 13 anos, o que na nossa visão era muito rápido”, afirma.

A portaria foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (14). O secretário de Gestão de Pessoas do MGI, José Celso Cardoso Jr., diz que, embora não tenha força de lei, a portaria vai induzir um processo de transformação na administração ao simplificar a estrutura remuneratória e de progressão da carreira.

“Como esse é um tema muito complexo, é difícil fazer uma reforma desse sistema na base da canetada, de cima para baixo”, avalia Cardoso Jr. “Não se consegue induzir uma transformação que não seja dialogada.”

O governo não fixou um prazo-limite para que os órgãos proponham a adequação de suas carreiras às diretrizes, mas a ministra não descartou essa possibilidade. “A gente pode estabelecer agora, depois da publicação [da portaria], a gente pode estabelecer um prazo”, afirma.

Os acordos fechados pelo governo até agora já contemplam 87% dos servidores, mas ainda há carreiras numerosas que não concluíram as negociações, como INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), Tesouro Nacional, CGU (Controladoria-Geral da União) e agências reguladoras. O governo pretende fechar os acordos até sexta-feira (16) para incluir os impactos na proposta orçamentária de 2025.

“[Se não fechar os acordos] Provavelmente eles não vão ter o reajuste em janeiro, talvez nem no ano que vem. Aí vai depender do espaço fiscal”, alerta.

Dweck avalia que os acordos de reestruturação de carreiras, que serão enviados ao Congresso, dão tempo para o governo conversar com os parlamentares sobre a melhor proposta de reforma. O governo Lula é contra a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 32, apresentada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Desde o ano passado, parlamentares de partidos do centrão, capitaneados pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, pressionam Lula a entregar uma proposta de reforma administrativa. O governo optou por buscar a aprovação de projetos em separado, como o que combate os supersalários e o de cotas no setor público, e começar as mudanças nas carreiras já nas negociações dos acordos.

“Temos um relatório para entregar para o Lira e muita coisa para demonstrar que a gente está fazendo na direção certa”, afirma Dweck. Ela cita manifestação recente do presidente da Câmara de que está disposto a conversar com o governo.

Além do alongamento das carreiras, as negociações feitas em 2024 também serviram para reduzir o salário de entrada em algumas situações, sobretudo naquelas em que a remuneração inicial estava acima de R$ 15 mil.

Dweck cita como exemplo as carreiras do ciclo de gestão, como analistas de comércio exterior, especialistas em políticas públicas e servidores da área de planejamento e orçamento ou finanças e controle. “Não baixou muito, mas estava quase R$ 21 mil a entrada. Passou para R$ 20 mil”, diz. “Se você, do ponto de vista da inflação, tem uma perda real relevante. No fundo, a gente tirou os 9% [de reajuste] do ano passado.”

Ela também ressaltou que novas negociações salariais só devem ser feitas em 2027, ou seja, os novos valores vão vigorar até lá, o que potencializa o efeito da redução dos salário de entrada.

A ministra ressalta que a remuneração reduzida valerá apenas para os servidores que ingressarem por meio de concursos futuros, após a aprovação das leis de reestruturação das carreiras. Uma vez empossados nos cargos, eles poderão progredir normalmente, respeitados os critérios estabelecidos pela administração federal.

A portaria ainda permite a criação de novos bônus, desde que restritos a servidores ativos, conforme o desempenho individual do servidor. Bônus institucionais, como é o da Receita Federal, pagos a ativos e aposentados, não poderão ser criados.

Dweck diz ainda que o governo busca a uniformização das carreiras, para dar mais flexibilidade aos órgãos. Hoje, o Executivo conta com 48 planos, 120 carreiras e mais de 2.000 cargos avulsos específicos.

“Estamos estudando juridicamente a possibilidade de juntar algumas carreiras, principalmente essas mais pulverizadas, administrativas”, afirma. Segundo a ministra, a ideia é propor carreiras transversais, sem pertencer a um ministério determinado. Isso permitiria uma mobilidade controlada dos servidores, conforme as necessidades.

Esse princípio norteia as discussões de criação de uma carreira civil no âmbito do Ministério da Defesa. “Estamos propondo que não seja uma carreira só para a Defesa, mas um pouco mais transversal entre outras áreas, por exemplo, da Justiça”, afirma.

Até o final do ano, o governo ainda vai enviar um projeto de lei sobre o direito de greve, que vai definir os serviços considerados essenciais para a saúde e a segurança dos cidadãos. Esses serviços não poderão ser paralisados durante a greve.

O projeto também trará procedimentos que deverão ser seguidos pelas categorias, como o anúncio formal da greve. Hoje, o Executivo recebe um comunicado geral, mas não tem o registro formal nos seus sistemas.

Segundo a ministra, os servidores apoiam a definição dos serviços essenciais em lei porque a Justiça acaba considerando 100% das atividades como essenciais, o que na prática pode por fim ao direito de greve.

“Os servidores toparam, porque eles viram que também era uma proteção”, diz.

A ministra ainda critica os diretores das agências reguladoras, que recentemente anunciaram que não fariam a reunião de aprovação de projetos em apoio aos servidores. “Isso não pode acontecer”, diz.

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