SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Para garantir que todas as escolas públicas do país tenham recursos suficientes para assegurar padrões mínimos de qualidade no ensino, o governo Lula (PT) precisaria destinar R$ 49,9 bilhões a mais para a educação básica em 2024.
Esse valor representa um aumento de 12% do que os estados e municípios brasileiros devem ter disponível para investir nesse ano em educação, cerca de R$ 408 bilhões.
O cálculo é de um estudo feito pela Fineduca (Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação) e pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Parte da pesquisa é financiada pelo MEC (Ministério da Educação).
Esses valores são calculados por um indicador, chamado CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial). Ele busca traduzir, em valores por aluno, o investimento necessário para o mínimo de qualidade a partir da realidade de cada escola.
Ou seja, o mecanismo calcula quanto cada unidade precisa de recursos para garantir, por exemplo, que os alunos tenham todas as aulas previstas, não estudem em turmas lotadas e com professores que recebem salários adequados. Ou ainda que todo estudante tenha acesso a uma escola com biblioteca, laboratório, quadra e também luz e água potável.
Por esse cálculo, o indicador aponta qual deve ser a ampliação da União no financiamento da educação pública brasileira. Ou seja, o governo federal seria responsável por complementar o valor por aluno em cidades ou estados que não conseguissem atingir o mínimo de recursos.
Pela lei do PNE (Plano Nacional de Educação), o Brasil deveria ter definido e iniciado a operacionalização do CAQi para financiar a educação básica até 2015. No entanto, até hoje o mecanismo não foi criado.
A fixação do dispositivo é responsabilidade do MEC. Em nota, a pasta comandada pelo ministro Camilo Santana reconheceu a importância de se instituir o CAQi, mas não informou prazo que isso aconteça.
Segundo o estudo, para ofertar uma educação com padrões mínimos de qualidade na creche seria preciso investir R$ 1.022 ao mês para cada aluno em uma unidade de tempo parcial e em área urbana.
Esse valor asseguraria, por exemplo, que as turmas tivessem no máximo 10 alunos por professor. Também garantiria que todos os docentes contratados tivessem formação em ensino superior e ganhassem, no mínimo, o piso salarial nacional.
Para as crianças que estudam em creche em tempo integral, o valor mínimo calculado é de R$ 2.104 ao mês por aluno.
Os custos por aluno são maiores no começo da trajetória escolar, já que na creche e pré-escola a qualidade do ensino depende de uma relação menor de estudantes por turma.
Na educação infantil também há um desafio maior de garantir que todos os professores tenham formação adequada (ensino superior em pedagogia) e recebam os salários previstos em lei.
“O cenário na educação infantil é bastante desafiador, até porque os padrões mínimos de qualidade não estão estabelecidos. Muitas redes de ensino colocam monitores e estagiários no lugar de professores. Por isso, os custos para essa etapa são mais altos”, disse Adriana Dragone, professora da UFPR e pesquisadora da Fineduca.
Dados do Censo Escolar 2023 mostram que apenas 63% dos professores do país que trabalham na educação infantil têm formação adequada para atuar com crianças dessa idade.
Para o ensino fundamental e ensino médio, os valores são mais próximos, sendo de R$ 668 por mês por aluno no período parcial na área urbana. Segundo o estudo, o custo mínimo é menor para essas etapas em decorrência do tamanho das turmas e das características das escolas que resultam em maior eficiência de escala.
“Os custos nessas etapas se diluem mais porque as escolas podem atender mais alunos, as turmas podem ter mais matrículas”, explica Adriana. Como padrão mínimo de qualidade, o CAQi considera, por exemplo, que as turmas tenham no máximo 30 alunos no ensino médio ou 20 nos anos iniciais do ensino fundamental.
O estudo também destaca a necessidade de um financiamento diferenciado para as escolas rurais, já que o custo para alcançar a qualidade mínima nessas unidades é cerca de 40% mais alto do que nas urbanas.
O custo das escolas rurais é maior por terem menos alunos e mais problemas de infraestrutura. Além da necessidade de uma política para levar professores para essas regiões mais distantes, como o pagamento de adicional como estímulo.
Os dados também mostram que, se implementado, o CAQi iria beneficiar sobretudo as escolas em regiões mais pobres. Dos R$ 49,9 bilhões de complemento, 58,7% seriam destinados para redes de ensino do Nordeste e 15,2% para as do Norte.
Em estados como Alagoas, Bahia, Maranhão e Piauí, os aportes da complementação significariam um incremento de pelo menos 30% nas receitas vinculadas para a educação básica
“O CAQi é um mecanismo de equalização de condições de oferta educacionais. Isso significa que ele distribui uma melhor complementação a quem tem menos recursos”, explica Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha Nacional pela Educação.
“Assim, além de impactar mais diretamente as escolas com menores indicadores socioeconômicos, ainda vai ter um impacto maior em grupos sociais mais marginalizados, como a população negra, indígena, do campo, das periferias, e nas regiões mais pobres, compondo a equalização federativa.”
O estudo mostra ainda que 80% dos recursos da complementação seriam destinados para redes de ensino em que a maioria dos alunos têm nível socioeconômico considerado baixo.
Além de estar previsto na lei do PNE, a definição de um padrão mínimo de qualidade já é previsto na Constituição, de 1988.
“A demora nessa regulamentação e implementação, que já somam 9 anos, acaba atrasando essa equalização de condições de acesso e qualidade para as escolas do país, prejudicando aquelas mais pobres e mais marginalizadas”, diz Andressa.
Em nota, o MEC disse que a regulamentação do dispositivo depende de publicação de lei complementar, na qual será instituído o Sistema Nacional de Educação e onde serão pactuadas as regras e padrões mínimos do CAQi.
Mesmo sem prazo para cumprir a lei, o ministério destacou que mudanças no Fundeb levaram à ampliação da complementação da União para financiar a educação. Também disse que em 2023 e 2024 uma comissão intergovernamental estabeleceu critérios para que escolas indígenas, quilombolas e do campo recebessem valores maiores. Também aumentou os repasses para matrículas em tempo integral, especialmente nas creches.