Chinês pede voto em mandarim em São Paulo, que tem 10 candidatos estrangeiros

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nas ruas, nas redes sociais, em português e em mandarim, André Ye (PSB) repete como um mantra que “cada chinês precisa trazer um voto”. Com a meta cumprida, o candidato crê que os imigrantes do país terão um representante, no caso ele, na Câmara Municipal de São Paulo.

“Somos 1,4 bilhão na China, mas em São Paulo só temos 250 mil. Se você é chinês, conto com seu apoio”, diz em uma das dezenas de postagens que publicou durante a campanha no WeChat, rede social chinesa. O conteúdo é todo bilíngue, em português e mandarim.

Ye Yong Yong, rebatizado de André no Brasil, é um empresário naturalizado brasileiro que disputa sua primeira eleição por uma vaga na casa legislativa da maior cidade do país. Nascido na província de Qingtian, no sul da China, ele migrou quando tinha 10 anos, em 1987.

“Eu era raquítico”, diz e mostra o registro do exame médico feito na sua terra natal, que registra o então menino com 1,38 metro e 31 quilos. Em São Paulo, foi vendedor ambulante, garçom, teve restaurante e atuou em associações de imigrantes.

Pelas contas de Ye, a capital paulista tem 25 mil chineses aptos para votar. “Quero ajudar também outras comunidades de estrangeiros. Sou chinês, está na minha cara, né? Mas vivi o que sofre qualquer imigrante”, afirma.

Ser um representante desse grupo na cidade que mais recebe estrangeiros no país é uma bandeira comum a candidatos em São Paulo. Pelo menos dez postulantes a uma vaga na câmara municipal nasceram em outros países.

A lista tem o boliviano Maurício Tufiño (Avante), o argentino Rodrigo do Mandato Animal (PSB), o belga Harold Thau (PDT), o haitiano Garry do Povo (PT), o indiano Amitabh Ranjan (Republicanos), o italiano Domenico Carone (PDT), os dois sírios Abdul Jarour (PSB) e Hanna (PRD) e a cubana Zoe Martinez (PL).

Em todo o Brasil, são 1.855 candidaturas de políticos que se declaram brasileiros naturalizados ou natos que nasceram fora do país. A Constituição Federal prevê que eles podem votar e se candidatar para todos os cargos, com exceção dos de presidente da República e vice.

Ye celebra a possibilidade que o país dá para seus imigrantes participarem da política, mas diz que sofre com questionamentos e preconceito por ser um candidato chinês no Brasil.

“Dizem que sou financiado pela China, pelo comunismo. Isso é absurdo”, afirma. “Olha, a única coisa que ganhei do consulado foi esse broche”, conta rindo e aponta para um pin comemorativo aos 50 anos das relações diplomáticas do país asiático com o Brasil.

O empresário denuncia casos de xenofobia nas redes sociais, onde lê comentários racistas. Ser alvo de ataques do tipo quase levou outro candidato a desistir da disputa em São Paulo. Em setembro, o sírio Abdulbaset Jarour (PSB) chegou a anunciar que deixaria o pleito.

Ele expôs os agressores em suas redes sociais. “Confia nao q ele vai mandar uns homens bomba pra sao paulo kkk” [sic], escreveu Wali ZS. “Vai se candidata no seu país mulsumano otário” [sic], publicou Marina de Andrade.

Abdul segue na disputa por uma vaga no Legislativo. “Tive que fugir, e o destino foi o Brasil. Deus abriu essa porta, mas fico triste porque as pessoas desconhecem a minha história e só querem atacar”, afirma.

Ser vítima de xenofobia e racismo é algo comum na rotina de imigrantes, diz Garry do Povo (PT), outro estrangeiro naturalizado brasileiro que tenta uma vaga na Câmara Municipal de São Paulo.

“Nasci no Haiti, mas sou de São Paulo”, responde quando questionado sobre sua origem. Seu plano como vereador é representar a população sem moradia e os trabalhadores ambulantes no legislativo.

Há 15 anos no Brasil, Garry encara sua quarta eleição em 2024. “Defendo os imigrantes, mas, infelizmente, imigrantes não votam”, lamenta.

Desafio semelhante vive o indiano Amitabh Ranjan (Republicanos), que tenta representar uma comunidade gigante no mundo (mais de 1,4 bilhão), mas pequena em São Paulo. Ele calcula que cerca de 5 mil imigrantes do país vivam na cidade. “Tenho apoio de quase todos”, diz confiante.

Ranjan está há 25 anos na capital paulista, para onde veio após engatar um relacionamento com uma brasileira. “Vim para passar três meses e fiquei até hoje”, afirma.

Seu maior desejo no legislativo municipal é incentivar as relações entre Brasil e Índia. Vê potencial para empresas indianas de tecnologia da informação, área em que o país asiático é líder, se instalarem na capital paulista. “Tentei isso de várias formas. Mas eu como CPF não tenho tanto valor. Como vereador, posso conseguir”, diz Ranjan.

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