SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um terremoto político ocorreu na eleição presidencial romena deste domingo (24), com a surpreendente vitória na corrida do primeiro turno de um obscuro candidato antissistema, simpático a Vladimir Putin e crítico da aliança militar Otan.
Nome de ultradireita, Calin Georgescu, 62, marcou 22,9% dos votos com 99,9% das urnas apuradas nesta manhã de segunda (25). As pesquisas anteriores ao pleito o colocavam na casa dos 5%, e a boca de urna, com 16%.
Em segundo lugar vinha a reformista Elena Lasconi, 52, que com pouco mais de 19% ultrapassou o premiê Maceu Ciolacu, um esquerdista amplamente alinhado à União Europeia e à Otan, clubes ocidentais aos quais Bucareste é filiada.
Antes, Ciolacu era visto como o favorito, mantendo a resistência romena à vaga nacionalista que domina as vizinhas Hungria e Eslováquia, que recedeu na Polônia na eleição parlamentar deste ano e será posta à prova no pleito presidencial de 2025 naquele país.
Também ficou de fora do jogo outro extremista de direta, George Simion, apelidado de “o Trump romeno”. Fã declarado do presidente eleito nos EUA, ele falava abertamente em cessar o apoio militar e político a Kiev.
Georgescu é crítico da ajuda a Kiev. Mas já elogiou fartamente a liderança de Putin em Moscou e é crítico à base do sistema antimísseis Aegis Ashore que a Otan opera na Romênia. Segundo ele, permitir a instalação do local foi um erro diplomático, e a aliança não irá socorrer Bucareste em caso de uma guerra com os russos.
Já Lasconi, uma conhecida correspondente de guerra, é favorável à continuação do apoio a Kiev contra os russos.
Como sempre, a economia falou alto. O agrônomo Georgescu, que deixou um partido de extrema direita que criticava sua posição contrária à Otan e concorre como independente, promoveu uma campanha viral no TikTok prometendo segurança alimentar aos romenos, o que passa por parar de ajudar Kiev.
O país de 19 milhões de habitantes é um dos mais pobres da União Europeia, registrando a maior inflação e o maior déficit orçamentário do bloco.
A chegada dele e de Lasconi, essa uma candidata de centro-direita, ao segundo turno que será disputado no dia 8 de dezembro é uma derrota da política tradicional representada no governo de Ciolacu no Parlamento, que reúne os sociais-democratas à esquerda e os liberais, à direita.
O arcabouço montado no país após a queda do comunismo em 1989 foi desmontado nas urnas. Também é uma rejeição a Klaus Iohannis, o presidente de saída. Na Romênia, há uma espécie de semipresidencialismo, com o chefe do Executivo com papel central na definição de política externa e de defesa.
Iohannis é tão alinhado à Otan que tentou ser seu novo secretário-geral, perdendo a disputa para o holandês Mark Rutte, que assumiu em outubro deste ano. Ambos são fortes adversários do Kremlin.
À agência Reuters, Sergiu Miscoiu, professor de ciência política da Universidade Babes-Bolyai, levantou a hipótese de interferência russa no pleito, dada a discrepância dos números de pequisas e o resultado final.
O Kremlin negou isso e buscou distanciar-se publicamente de Georgescu. Segundo o porta-voz de Putin, Dmitri Peskov, a Rússia tem poucas informações acerca do que pensa o vencedor do primeiro turno.
O próprio seguiu falando generalidades, já na noite de domingo, quando sua vitória parecia encaminhada. “Somos fortes e corajosos, muitos de nós votaram, ainda mais o farão no segundo turno”, afirmou.
A importância da Romênia vai além dos números no apoio a Kiev. Nesse campo, até 31 de agosto o país havia dado o equivalente a R$ 725 milhões aos vizinhos, segundo o Instituto para a Economia Mundial de Kiel (Alemanha), o que o colocava em 31 entre 42 doadores dos ucranianos.
Sua mais vistosa contribuição militar ainda não ocorreu: o governo aprovou o envio em breve de uma bateria antiaérea americana Patriot, um dos ativos mais preciosos e desejados pelo governo de Volodimir Zelenski.
Mas a Romênia é importante para o escoamento de grãos de Kiev por seus portos no rio Danúbio as instalações do lado ucraniano são alvos frequentes de ataques russos. Além disso, o país montou um centro de treinamento para pilotos ucranianos aprenderem a voar o F-16, caça americano doado em quantidade limitada a Zelenski.
Com 614 km de fronteira com a Ucrânia e usualmente atingida por destroços de drones de Putin, a Romênia é uma sensível linha de frente da Otan no conflito. O país também sedia uma importante base aérea da Otan.
GUERRA SEGUE INTENSA
Do outro lado da fronteira, a guerra continuou intensa nesta segunda. A Rússia lançou 145 drones durante a noite contra diversas regiões ucranianas, 71 dos quais foram abatidos segundo Kiev. O restante alvejou principalmente redes energéticas, mantendo o já combalido sistema do país pressionado a poucas semanas da chegada do inverno.
Na mão contrária, Moscou disse ter abatido oito mísseis balísticos nas últimas 24 horas, principalmente sobre a região de Kursk, que ainda tem uma fatia pequena ocupada por forças de Zelenski.
Os modelos não foram divulgados, mas presumivelmente há alguns ocidentais entre eles o aval dado pelos EUA e aliados a isso gerou uma dura reação de Putin, que estreou uma nova arma na guerra na semana passada, bombardeando Dnipro com um míssil balístico desenhado para conflitos nucleares.