Argentina de Milei trava há quase 5 meses brasileiro em fundo do Mercosul

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo do ultraliberal Javier Milei trava há quase cinco meses a indicação de um funcionário brasileiro para um cargo executivo no Focem, o fundo de redução de assimetrias do Mercosul (bloco formado por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Bolívia).

Por trás da oposição argentina há uma profunda desconfiança do governo Milei com o Mercosul e com o fundo abastecido majoritariamente com dinheiro de Brasil e Argentina, mas cujos principais beneficiários são os sócios menores: Paraguai e Uruguai.

O Focem foi criado em 2004 com a meta de receber US$ 100 milhões por ano para financiar projetos de infraestrutura nos países do bloco, com foco na integração das áreas de fronteira. Nos últimos 17 anos, segundo cálculos do governo argentino, foram aprovados mais de 50 projetos com recursos do fundo, um valor aproximado de US$ 996 milhões.

Em 27 de maio, o governo Lula (PT) apresentou a candidatura do economista Luciano Wexell Severo para ser o coordenador-executivo da Unidade Técnica do Focem. A função de Severo, funcionário do Ministério do Planejamento, seria avaliar e acompanhar a execução dos projetos financiados, além de coordenar os trabalhos das unidades técnicas em cada um dos países-membros.

O Uruguai apoiou imediatamente a candidatura de Severo. O Paraguai, pouco depois. Mas a Argentina tem bloqueado a indicação.

Na reunião do Conselho de Administração do Focem, segundo a ata disponível no site do Mercosul, a delegação argentina argumentou que desde 2007 a unidade funciona sem um coordenador-executivo titular e que, nesse período, outras candidaturas foram apresentadas sem sucesso.

Desde maio, o governo Lula tem pressionado pela nomeação de Severo em todas as reuniões ligadas ao Focem. Segundo as atas analisadas pela reportagem, os argentinos têm repetido os mesmos argumentos.

Procurado para comentar a situação de Severo, o Ministério do Planejamento disse que indicações de brasileiros para organismos multilaterais são negociadas e acompanhadas pelo Itamaraty. “O Ministério do Planejamento aguarda as negociações conduzidas pela chancelaria brasileira”, disse.

A pasta comandada por Simone Tebet afirmou ainda não ver prejuízo ao funcionamento do Focem com a demora da confirmação do economista.

A reportagem também procurou o Ministério de Relações Exteriores, Comércio Internacional e Culto da Argentina, mas não houve resposta.

Milei encara o Mercosul com ceticismo. Antes de se tornar presidente, afirmou que retiraria a Argentina do bloco, promessa que nunca foi concretizada.

Apesar de sua chanceler, Diana Mondino, ter atuado para evitar medidas radicais em relação ao bloco e para manter a Argentina no grupo, Milei já sinalizou que o tema não está entre suas prioridades.

No início de julho, ele faltou à cúpula de chefes de Estado do Mercosul, realizada em Assunção (Paraguai). Preferiu participar de uma conferência de conservadores em Balneário Camboriú (SC), ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Para o governo Lula, o bloqueio a Severo gera especial incômodo porque sua indicação ocorreu pouco depois da quitação de uma dívida do país com o fundo de US$ 99 milhões. Pelas regras do Focem, a quitação permite que cerca de US$ 70 milhões disponíveis sejam usados dentro do território brasileiro –os projetos precisam estar numa faixa de 150 quilômetros da fronteira, para trazerem benefícios aos vizinhos. A ideia era que Severo, uma vez no cargo, pudesse acompanhar de perto esses projetos.

Como principal integrante do Mercosul, o Brasil é responsável por 70% do aporte anual para o Focem. A Argentina, por 27%. Ao Uruguai cabe contribuir com 2% e, ao Paraguai, 1%. Os beneficiários seguem ordem inversa. O Paraguai recebe 48% dos recursos do Focem, o Uruguai 32%, enquanto Brasil e Argentina ficam com 10% cada um.

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